sábado, agosto 27, 2005

Solidão

Virgínia pediu a Adriano que não lhe procurasse nunca mais, e ele riu, porque ela sempre dizia isso e depois voltava a procurá-lo, em prantos. Adriano fingia uma injúria e pensava que Virgínia era uma tola, porque sabia que ela havia ido para casa chorar enquanto ele, ah, ele sempre estaria bem, pelo menos enquanto houvesse Virgínias chorosas reincidentes na sua vida. E Virgínia, como era de se esperar, chorava copiosamente em seu quarto, esperando o dia em que terminaria por chorar toda aquela dor para fora de si, mas com a certeza de que esse dia jamais chegaria.

sábado, agosto 20, 2005

Um amor inventando

Isolda sempre foi uma garota sonhadora. Mesmo quando as coisas não iam bem, ela não perdia o sorriso no rosto. Isolda sempre foi sonhadora e justa, nunca conmtou mentiras que magoassem [e as mentiras que contou foram tão poucas que eu arriscaria dizer que nunca contou alguma] e sempre foi a pessoa a apaziguar todas as confusões em que Izolita, por seu jeito calado e grosso, se metia. Sendo confundida com Justiça, Isolda nunca deixou de se levar pelos seus desejos mais utópicos. Não queria casa, roupa lavada, comida, carro. Queria sempre muito mais. Queria uma garrafa de vinho tinto num canto novo qualquer do mundo em uma companhia suave, que fosse por um dia. Queria ver o museu mais velho, a melhor dançarina, ir no melhor pub inglês, conehcer a pessoa mais divertida. Tudo que sonahva, tinha que ser com o melhor. Mas o melhor não era uma comparação com os piores. Era só um jeito de Isolda mostrar que queria ver o mundo. E queria vê-lo com seus próprios olhos, sentí-lo com seus dedos. Não queria gurdar fotos ou filmes. Não queria sequer alguém para acompanhá-la. Desejava com toda sua alma ver o desconhecido e trazê-lo consigo como parte de seu ser. E é por isso que acho que Isolda, das três, é a mais sonhadora. Ela não é tão romântica quanto Janaína, nem solitária como Izolita. Ela inventa seus amores através dos olhos que vê. O amor de Isolda nunca se cansa, mesmo pousado sobre Marcelo. Isolda ama o mundo sem limites.

terça-feira, agosto 16, 2005

Necessita-se

Virgínia necessita de uma nova vida, já não tem mais nada. Daniel é morto, Adriano lhe equivale. Virgínia toma hi-fis.

De Pedro, pelo correio.

Izolita,
não me manda mais essas suas cartas, contos, poemas. Sei que nenhum deles é para mim, nunca foi para mim. Estou cansado de receber seus elogios fúteis e suas cantadas inúteis. No meu coração te cabia inteira, mas você escolheu se esconder de mim. Chega de e-mails, poesias em blogs. Já disse, já disse, saia da minha vida. Você resoncstrói carinhos tão culpados quanto você mesma e se rende às ironias do mundo como sempre disse que não iria fazer. Você, Izolita, é solidão porque quer, e depois chora pelos cantos que quer mesmo é um colo bom. Você disse que teve os melhores colos, os melhores olhos, os melhores amores... quem os deixou foi você. Izolita, querida, você já não faz parte das minhas paredes e nem das minhas fotos. Você não aparece mais nos bares que frequento e sua vida já não me interessa.

Se eu te amo? Amo. Porém, você já não é digna de meu amor.

Mono-diálogo inventado

Janaína, enterrada em seu caixão minúsculo, se sentia como Calamidade, talvez. Daquele dia em diante, tudo lembraria o dia em que ela morreu. Confinada em seu caixinha-novo-lar, pensou em Vírginia e nas rodas de samba que teimosamente frequentavam, apesar do pouco traquejo para a dança. E ensaiou seu diálogo, dizendo à Vírginia que não desaparecera, que só estava ali, guardada do mundo para não mais sofrer. E balbuciou algumas palavras sem sentido, dizendo-se parede. Dizia que agora era um sentimento de um garden state. Para Janaína, garden state significava exatamente aquilo: parada, sem sentimentos, com os sentidos vedados pelas madeiras estreitas que a separariam por algum tempo do resto. Falou que não era inexistente, já que nem os mortos desaparecem [veja Calamidade]. Mas já não era visível, não ali, enterrada. Dizia para si mesma que iria conseguir achar algum lugar para se instalar, assim que quisesse se deparar com as pessoas. E pensou que para enfrentar seres humanos precisava sentir alguma coisa: medo, dor, solidão, amor, o que quer que fosse. Precisava sentir, e não havia nada em seu peito. Não sentia sequer a náusea comum da existência humana. Para reviver, ou conviver, precisaria sentir o calor dos braços desconehcidos e deitar-se em outras camas, já que havia renunciado a do amante há muito. Precisaria voltar e sentir raiva, angústia.
Janaína ensaiou todo esse mono-diálogo. E não chegou a contá-lo à Vírginia. Deixou que Vírginia queimasse sua fênix e que ela renascesse quantas vezes fosse. Embora torcesse para renascer com outras formas e personalidades.
Janaína, dentro de seu caixão claustrofóbico agradeceu por poder dormir mais um pouco. E esqueceu, por agora, o mundo.

segunda-feira, agosto 15, 2005

Sobre Daniel

Daniel criava aranhas, Virgínia as detestava porque lhe davam arrepios, mesmo as mais coloridas e brilhantes de todas. Tinha verdadeiro pavor das teias reluzindo sempre que o sol invadia pelas janelas o quarto do irmão. Daniel não entendia, nem à Virgínia, nem às teias de aranha na janela, mas gostava delas, das duas, porque cheiravam a abandono, cheiravam ao acaso. Virgínia gostava do irmão, gostava do seu colo, das suas tardes bestas na fazenda, e gostava, acima de tudo, porque ele era mais do que aparentava ser. Quando Daniel se foi ela não teve coragem de expulsar as aranhas, nem de limpar as janelas. As teias de aranha na janela eram uma das poucas coisas que Daniel não entendia, e Virgínia, na sua mania de nomear as coisas pequenas, achava que elas se chamavam Amor. Talvez por isso não as tenha limpado. Virgínia não tem coragem de entrar naquele quarto, porque as aranhas de Daniel lhe são hostis. Daniel diria que ela é uma boba, ele sempre dizia, e diria que Adriano a faz de palhaça. Mas seria apenas isso, Daniel não falava sobre amar, na verdade, Daniel não falava sobre nada sério. No fim, Daniel se foi, e Virgínia se lembra dele toda vez que avista uma teia de aranha sob o sol.

Não se sabe porque (junto ou separado?)

Ensaiou um diálogo com Janaína, mas não havia mais Janaína, Virgínia estava só. Virgínia descobriu sozinha que os amores morrem, mas o seu era como uma fênix que teimava em renascer a cada menor toque do olhar. Se ainda entendesse disso, nomearia o seu amor de Solidão e o entregaria a Adriano uma última vez num dia nublado.